terça-feira, 26 de abril de 2011

POLÊMICA NA CIRURGIA BARIÁTRICA

A aprovação pela câmera técnica do Conselho Federal de Medicina de duas novas cirurgias para obesidade mórbida, inclusive da polêmica cirurgia recentemente desenvolvida pelo Dr. Aureo Ludovico de Paula de Goiânia, GO -  gastrectomia vertical com interposição ileal, gerou resposta por parte da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, na voz do seu atual presidente Dr. Ricardo Cohen de São Paulo e réplica do professor Edmundo Ferraz de Recife, ex-presidente do CBC.
Vejam alguns passos da polêmica
1. Reportagem no Jornal Estado de São Paulo

13 de abril de 2011 | 0h 00
Karina Toledo - O Estado de S.Paulo



Cirurgia bariátrica polêmica ganha apoio 
Câmara técnica do CFM aprova, em votação esvaziada, técnicas ainda experimentais;
médicos denunciam manobra


"A Câmara Técnica Sobre Cirurgia Bariátrica e Metabólica do Conselho Federal
de Medicina (CFM) aprovou, no fim de março, a regulamentação de duas
cirurgias consideradas experimentais por especialistas de todo o mundo. Uma
delas é a gastrectomia vertical com interposição ileal, conhecida como cirurgia
do Faustão depois que o apresentador Fausto Silva revelou ter se submetido
ao procedimento.
Para ter validade, a decisão precisa ser referendada pelo plenário do CFM.
Médicos que compõem a câmara técnica afirmaram ao Estado que o tema foi
incluído na pauta da reunião que deve ocorrer nesta semana.
Ontem, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica divulgou
carta de repúdio à "falta de transparência no processo de aprovação das novas
técnicas". Segundo o texto, no dia da reunião, sete dos nove membros que
compõem a câmara técnica estavam nos Estados Unidos, participando
Congresso de Intervenção para Terapia do Diabetes Tipo 2. "Não existem
ainda na literatura médica estudos clínicos em número suficiente para que
seja possível aplicar tais técnicas com a devida segurança", diz a carta.
O médico Orlando Pereira Faria, que é membro da câmara técnica e pertence
ao grupo excluído da reunião, diz que a decisão causou um sentimento de
revolta no meio médico. "Estão querendo aprovar as técnicas de maneira
rápida e com interesses que não são o bem-estar da sociedade."
A interposição ileal está proibida desde o ano passado por liminar da Justiça.
O médico que criou a técnica, Áureo Ludovico de Paula, está sendo processado
por ter operado diversos pacientes sem protocolo de pesquisa e por ter
cobrado pelo procedimento. A outra técnica aprovada foi a bipartição gástrica,
criada pelo médico Sérgio Santoro.
Procurado, o CFM negou por meio de sua assessoria a aprovação das técnicas.
Depois voltou atrás, quando o Estado revelou ter a ata da reunião. Em nota, o
órgão afirmou que "os encaminhamentos realizados no âmbito de suas
comissões e câmaras técnicas não possuem caráter terminativo."


2. Resposta da presidência da SBCBM

São Paulo, 11 de abril de 2011.
Ilmo Sr. Dr. Carlos Vital Tavares Corrêa Lima
DD Presidente das Câmaras Técnicas do CFM
Ilmo Sr. Dr. Abdon Murad
DD Coordenador da Câmara Técnica de Cirurgia Bariátrica e Metabólica
Prezados Senhores,
A nossa Sociedade é pioneira nas pesquisas clínicas em cirurgia bariátrica e metabólica no mundo.
Causou-nos surpresa que em 30/03/2011 foram aprovadas por essa distinguida Câmara Técnica, por "unanimidade" com a presença de 2 (DOIS) membros, procedimentos ainda em discussão por experts no mundo.
Porque a afirmação que estão ainda em discussão? Porque em 30/03/2011, mais de 2/3 (DOIS TERÇOS) dos membros desta Câmara Técnica, estavam em Nova York, discutindo diretrizes para a adoção de novas técnicas operatórias em cirurgia gastrointestinal bariátrica e metabólica. Esses membros comunicaram com antecedência razoável (15 QUINZE dias) que não poderiam comparecer a essa reunião de 30/03/2011. E eles estavam dentre cerca de 1000 participantes, incluindo grandes nomes mundiais no assunto como 2 laureados com o PREMIO NOBEL da Medicina e Fisiologia, que escutaram que os procedimentos que devem ser estudados para seu emprego em cirurgia bariátrica e metabólica, independente do IMC dos pacientes, são aqueles que constam da RESOLUÇÃO CFM Nº 1.942/2010. Todos os outros, por enquanto, devem permanecer no âmbito das investigações clínicas sob uma aprovação de Comitê de Ética em Pesquisa.
Somos uma Sociedade inovadora e com papel de destaque no cenário mundial. Somos propulsores de inovações, desde que elas sejam, adotadas comedidamente e com comprovação de resultados, reprodutibilidade de sua realização e apoio Multisocietário, isto é, que tenhamos consenso de múltiplas origens, que são procedimentos adequados a tratar os nossos pacientes. Finalmente, obesidade e suas comorbidezes são enfermidades primariamente clínicas e nós cirurgiões somos parte importante do tratamento, quando bem indicado.
Somos os maiores representantes da divulgação dos procedimentos que estão autorizados pelo CFM. Portanto, esperamos que decisões dessa importância sejam levadas adiante com a devida cautela que o tema requer.
Certos de contar com vossa atenção,
Dr. Ricardo Cohen
Presidente da SBCBM


3. Réplica Dr. Edmundo Ferraz - TCBC PE


Carta Aberta ao Dr. Ricardo Cohen
Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica

Sr. Presidente,
Tomando conhecimento do teor de sua carta divulgada amplamente através do site da SBCBM e endereçada aos membros da Sociedade e ao Presidente da Câmara Técnica (CT) do CFM desejo comentar o que se segue:
O teor de sua carta é falso e pretensioso. A reunião da CT do CFM foi realizada no dia 12/4/2011com quorum adequado para sua realização. Estiveram presentes cinco membros e não apenas dois como V.Sª referiu.
E que cinco membros: Dr. Abdon Murad membro do CFM, Coordenador da CT que presidiu a sessão e ainda os Prof. Cleber Kruel atual Presidente do Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva (CBCD) membro nato da CT, Prof. Nelson Andreollo, ex-Presidente do CBCD e ex-Membro da CT representando o Prof. Bruno Zilberstein, Prof. Edmundo Machado Ferraz, ex-Presidente do Colégio Brasileiro de Cirurgiões (gestão 2008-2009) representando por delegação do atual Diretório Nacional do CBC (um dos quatro pioneiros da Cirurgia Bariátrica no Brasil), todos três Professores Titulares de Cirurgia na UFPE, UNICAMP, URGS e o Dr. Luiz Claudio Chaves, pioneiro da Cirurgia Bariátrica no Pará e membro nato da CT. Faltaram a reunião, o Dr. Orlando Faria, o Dr. Bruno Zilberstein que solicitou e foi substituído pelo Prof. Nelson Andreollo e a representante da Abeso.
Deve ser salientado que os representantes de Instituições podem solicitar previamente e enviar substitutos quando de seus impedimentos, o que não é raro nas reuniões da CT do CFM.
Portanto a reunião foi legal e com quorum qualificado. Nesta reunião foram respondidas algumas alegações oriundas de advogados e redigida uma Comunicação Interna dirigida ao Presidente do CFM solicitando o encaminhamento ao Plenário do CFM para homologação da decisão da CT tomada em 21/5/2010. Também é de seu conhecimento de que a SBCBM não é área de atuação e que os Títulos de Especialistas são atributos do CBC e do CBCD nas áreas de Cirurgia Geral e da Cirurgia do Aparelho Digestivo. O Conselho Federal de Medicina (CFM) e não a SBCBM como seria do seu desejo, é o órgão que legisla as questões através de pareceres emanados pela Câmara Técnica homologadas pelo plenário do CFM o que se transforma em Resolução após a homologação.
Em 21/5/2010 fui o relator na CT do CFM sobre a Gastrectomia Vertical e a Interposição Ileal. O documento que apresentei segue anexo com essa carta para que sejam do conhecimento de todos os membros da SBCBM para que possam conhecer os meandros dos conflitos de interesse que tentam tumultuar a atuação legal do CFM. Espero e solicito que V.Sª os divulgue no site da Sociedade.
Meu relatório foi aprovado por cinco votos contra dois e dos seis cirurgiões presentes, cinco votaram a favor. Deste modo a Gastrectomia Vertical associada a Interposição Ileal foi aprovada na CT do CFM faltando a sua homologação pelo Plenário. A revisão da literatura foi extensa e a mais completa possível.
Em Resolução aprovada no final de 2010 a Gastrectomia Vertical foi incluída nas operações consideradas aceitas após homologação pelo plenário do CFM, não tendo a Interposição Ileal sido ainda submetida para homologação pelo plenário. Para esclarecimento dos membros não especialistas que compõem o plenário do CFM foram realizados dois seminários no CFM para discussão ampla dos procedimentos, critérios de aceitação utilizados nos procedimentos cirúrgicos já reconhecidos o que já gerou uma nova proposta com mudança do paradigma de novos procedimentos em Medicina também discutida na CT e que irá ao Plenário para homologação.
Deve ser salientado que a discussão refere-se ao tratamento cirúrgico da Obesidade Mórbida (IMC igual ou superior a 35 com co-morbidade ou IMC igual ou superior a 40 com ou sem co-morbidades). Em nenhum momento a CT discutiu a conduta fora desses parâmetros ou a indicação de tratamento cirúrgico para a Diabetes tipo 2 dissociada de Obesidade Mórbida. Todas as operações consideradas aceitas pelo CFM foram baseadas em critério de reconhecimento da comunidade cientifica nacional e internacional. Nenhum foi baseado em evidência ou previamente aprovado pelo CONEP.
Como todos poderão observar lendo o meu parecer a literatura demonstra que a Interposição Ileal é um procedimento usado desde 1928 e em cirurgia bariátrica há aproximadamente 30 anos, (Stone, KS et al 1981) não sendo considerada um novo procedimento pela CT do CFM . Tem amplo reconhecimento internacional caracterizado por 170 citações internacionais nos índices SCOPUS, Index Médico e mais de 10 publicações em revistas de grande impacto (índice superior a 1,5). É praticada por inúmeros cirurgiões no Brasil e no Exterior todas referidas em meu parecer com amplo racional que justifica o procedimento considerado aceito pela CT do CFM. Recentemente (final de 2010 e inicio 2011) foram defendidas e aprovadas após o meu relatório seis Teses de Doutorado com o procedimento gastrectomia vertical (GV) + interposição ileal (II) em animais de experimentação na UNIFESP existindo mais duas para serem defendidas, além de duas Teses de Doutorado aprovadas na UFMG orientadas pelo Prof. Paulo Roberto Savassi Rocha em humanos, previamente aprovadas pelo CONEP. Na UFPE já temos um protocolo de estudo em humano aprovado pelo CONEP e muitos outros projetos em andamento em Universidades Públicas que irão certamente reconhecer o procedimento da GV+II como uma grande contribuição da cirurgia brasileira. O autor Dr. Aureo Ludovico de Paula tem mais de 700 operações realizadas com cerca de 300 pacientes com seguimento igual ou maior do que 5 anos. A taxa de mortalidade é inferior a 2% e a de grandes complicações inferior a 4%. Todos os prontuários estão a disposição da CT do CFM e todos os termos de consentimento esclarecidos foram registrados em cartório encontrando-se os detalhes dos cuidados dos procedimentos detalhados em meu parecer.
É também importante assinalar que conheço o Dr. Aureo há muitos anos, porém não tenho qualquer conflito de interesse com ele. Nunca estive em sua casa ou ele na minha e faz mais de 4 anos que não visito a sua cidade. A GV associada a II tem começo, meio e fim. É um procedimento que honra a cirurgia brasileira e já foi objeto de 4 Editoriais de autores consagrados na literatura internacional em revistas de grande impacto.
Solicito a todos os membros da SBCBM que leiam meu relatório, analisem os Trabalhos e Editoriais publicados, escrutinem os resultados, participem dessa discussão e sejam testemunhas de um procedimento que por não provocar desabsorção (demonstrada na Tese de Doutorado da Drª Luciana El Kadre na UFMG) tem um grande futuro nas indicações cirúrgicas na cirurgia metabólica particularmente em pacientes diabéticos de baixo peso que presentemente vem sendo amplamente discutido na literatura internacional.
Estarei a disposição de todos para responder a qualquer dúvida através de meu e-mail – edferraz@truenet.com.br ou meu celular 81-99713739.
A SBCBM não pode ser utilizada por seus presidentes para ditar normas para o CFM como se atreve o seu atual Presidente em correspondência endereçada ao Vice-Presidente do CFM e ao atual Coordenador da CT do CFM em tom professoral sem ter sequer comunicado a sua Diretoria e discutido previamente o teor de seu ofício endereçado ao CFM de forma pretensiosa e inadequada, enviando o documento como um fato consumado, sem qualquer tipo de discussão prévia de um importante assunto que é de interesse de todos.
Mais uma vez, como fiz na gestão passada na SBCBM, protesto contra a atitude isolada e intempestiva do seu Presidente, Dr. Ricardo Cohen afrontando o CFM e o pensamento democrático existente na grande maioria dos membros de nossa Sociedade que certamente não apoiarão esta posição assumida pelo atual Presidente sem prévio consentimento da atual Diretoria.
Recife, 14 de abril de 2011.

Edmundo Machado Ferraz
       

Um comentário:

  1. Interessante a discussão!
    Por favor, vistem meu blog, escrevo frequentemente sobre cirurgia bariátrica.
    Obrigada!
    http://ocorpoemeu.blogspot.com

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