terça-feira, 19 de abril de 2011

ARTIGO BOLETIM CBC - SÃO PAULO

A T U A L I D A D E S C I R Ú R G I C A S
Órgão Informativo do Capítulo de São Paulo do Colégio Brasileiro de Cirurgiões
Departamento de Cirurgia da Associação Paulista de Medicina
Nº 47 DEZ/10
Logística Reversa
TCBC Marco Cezario de Melo
Inicialmente a logística empresarial tratava, tão somente, dos fluxos físicos e informacionais da origem do produto até o local de consumo, sem se importar com o seu descarte. Atualmente vem se pensando também, no fluxo reverso – a logística inversa ou reversa – alargando a gestão do ciclo de vida do material. Segundo Rogers e Tibben-Lembke, logística reversa é: “O processo de planejamento, implementação e controle do fluxo eficiente e de baixo custo de matérias primas, estoque em processo, produto acabado e informações
relacionadas, desde o ponto de consumo até o ponto de origem, com o propósito de recuperação de valor
ou descarte apropriado para coleta e tratamento de lixo.” Na verdade, trata-se de um termo utilizado para designar o processo relacionado à reutilização de produtos e materiais assegurando recuperação sustentável. Em última análise é a “Administração de Recuperação de Produtos” (“Product Recovery Management”– PRM) definida por Thierry como: “o gerenciamento de todos os produtos, componentes e materiais usados e descartados pelos quais a empresa fabricante é responsável”. No passado não havia preocupação com os resíduos sólidos até a humanidade perceber que não existe área física para armazenar todo esse lixo. A busca por menores impactos ambientais, registrada atualmente, decorre das exigências da sociedade moderna e das imposições legais dos governos representantes dessa própria sociedade. O retorno do produto no pós-consumo deve ser equacionado pelas empresas que definirão seu destino: sua reutilização, desmanche, venda ao
mercado secundário, remanufatura, reciclagem, incineração e destino final. A introdução tecnológica na medicina foi capaz de trazer imensos benefícios aos nossos pacientes como a menor invasão
durante procedimentos endoscópicos, percutâneos ou através da videocirurgia. Essas abordagens preservam, ao
máximo, a integridade da barreira mucocutânea, diminuindo a repercussão da agressão e complicações decorrentes. A barreira mucocutânea, constituída pela pele e mucosas, não só funciona como bloqueio mecânico, mas promove mecanismos específicos na preservação do ecossistema local (microbiota humana). A manutenção do sistema ecológico, constituído pela microflora, é necessária ao equilíbrio entre o ser humano e o ambiente que o cerca, fundamental à preservação da vida do próprio hospedeiro. No entanto essa evolução propiciou maior utilização de instrumentais de uso único – os descartáveis – que produzem resíduos sólidos capazes de causar problemas para a ecologia do planeta, extremamente relevantes no pensamento globalizado nesse século XXI. Para amenizar esse impacto ambiental necessário se faz um gerenciamento responsável
do retorno do material utilizado. Na área da saúde vem sendo questionada a reutilização dos descartáveis, embora provas existam da inviabilidade de uma esterilização segura de grande quantidade desse material,
pela impossibilidade de limpeza adequada e deterioração do material pelo uso repetido. A extensão da vida útil pelo retorno ao ciclo produtivo através de canais de desmanche, reciclagem e reuso, economizando matéria prima pode ser uma grande solução do problema.
Segundo pesquisadores de várias universidades, sob a coordenação da Erasmus University Rotterdam – Holanda, a logística reversa terá que ser implantada nas firmas produtoras de materiais de consumo pelos seguintes motivos:
a. Legislação ambiental em surgimento nos diversos países.
b. Benefícios econômicos (alto custo do processo de descarte
correto).
c. Crescente conscientização ambiental dos consumidores.
Por trás deste conceito existe a definição de ciclo de vida onde um produto, do ponto de vista logístico, não se acaba com sua entrega ao consumidor, mas deve retornar a sua origem para ser adequadamente descartado, reparado ou reaproveitado. Além disso, por motivos estratégicos e razões competitivas, a logística reversapode ser utilizada para a diferenciação entre as firmas produtoras.
No Brasil, também existe preocupação com esse assunto, tanto que em 10 de março de 2010, foi publicada a redação final do substituto da Câmara dos Deputados ao projeto de lei N203-B de 1991 do Senado Federal, que dispõe sobre o acondicionamento, a coleta, o tratamento, o transporte e a destinação final dos resíduos em saúde, no qual são estabelecidas as condições de implantação da logística reversa considerando-a um instrumento de desenvolvimento econômico e social, constituído por um conjunto de ações, procedimentos
e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento em seu, ou em outros ciclos produtivos, acrescido de uma destinação final ambientalmente adequada.
logística reversa precisa ser entendida pelas empresas como oportunidade de agregar valor, quer pela imagem junto à sociedade com relação aos aspectos ambientais e responsabilidade social, quer pela oportunidade de adicionar serviços. Certamente criará diferenciais competitivos pela gestão integrada do ciclo do descartável e do desperdício envolvidos ao longo da vida do produto, possibilitando a redução de
custos e gerando vantagem competitiva. A matéria prima reutilizada para a industrialização de um novo produto trará, seguramente, um benefício econômico além do benefício ecológico.
O compromisso da humanidade com os resíduos gerados, em toda forma de atividade, faz parte da cidadania com todas as implicações dela decorrentes. Essa preocupação é extrapolada no que diz respeito aos resíduos dos serviços de saúde, especialmente em relação ao gerenciamento deste descarte com o fim de minimizar a poluição do planeta. O uso de descartável, fundamental para a realização segura dos procedimentos de invasão mínima tem sido discutido, sendo necessária uma tomada de posição coerente e sensata. Deve ser antevista a possibilidade de mudanças desde a sua confecção, averiguando-se a possibilidade de reutilização segura, com
elaboração de critérios para seu uso até o descarte, avaliandos e a opção de reciclagem do material, com o pensamento voltado à preservação do ecossistema de nosso planeta. Com a implantação da logística reversa aos materiais de consumo único utilizados nos procedimentos de invasão mínima, os produtores de descartáveis estarão contribuindo, de forma efetiva e politicamente correta, para a manutenção, não somente da microbiota humana contemplada com a preservação da barreira mucocutânea, mas para o equilíbrio ecológico global do planeta. A humanidade agradece.
Nota: O assunto deste artigo assim como outros temas relacionados à compreensão e o desenvolvimento da videocirurgia são abordados no livro “A Reconfiguração da Cirurgia”.
Mais informações: cezario@truenet.com.br

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