quinta-feira, 18 de março de 2010

VIDEOCIRURGIA & CÂNCER

METÁSTASES TUMORAIS NOS LOCAIS DOS PORTAIS
Contribuição do Dr. Mário Postiglione - Cirurgião Geral de Caxias do Sul, RS e aluno do Curso de Extensão em Cirurgia Vídeo-Laparoscópica do Hospital Parque Belém
No início das experiências em cirurgia videolaparoscópica, houve grande controvérsia na literatura sobre o risco de recorrência tumoral e maior incidência de metástases descritas em sítios de portais. Este dilema está atualmente compreendido, analisado e resolvido.
Nas grandes séries da literatura, a incidência de metástases em sítios de portais é de 0,1% quando são realizadas linfadenectomias pélvicas. Em oito centros participantes da pesquisa foi reportado um total de 13 casos de disseminação tumoral em um universo de 7.047 pacientes. Outros doze centros urológicos, realizando cirurgias em 3.865 pacientes, não registraram nenhum caso de implantes de células tumorais. Analisando 10.912 casos de cirurgias oncológicas urológicas por vídeo, o implante de células tumorais foi documentado em 13 pacientes, representando 0,1%.
Vários autores realizaram revisões em casos de prostatectomias radicais e não encontraram implantes tumorais secundários. Outros trabalhos de revisões, em centros europeus, documentaram a realização de 813 prostatectomias radicais e 177 linfadenectomias pélvicas sem nenhum implante de células tumorais.
A ocorrência de implantes tumorais em sítios de portais tem um potencial de ocorrência secundário a múltiplos fatores. Vários estudos clínicos e experiências determinam que as causas dos implantes possam ser divididas em quatro principais categorias:
1- Agressividade biológica da célula tumoral, seu comportamento natural, seleção de clones e linhagens celulares;
2- Processos locais ao nível dos traumas cirúrgicos;
3- Respostas humorais, celulares e o comportamento imunológico do hospedeiro;
4-Fatores relacionados com o processo de videocirurgia (tipo de gás, pneumoperitônio, aerosolização, insuflação e desinsuflação, vazamentos em membranas dos trocateres), manipulação tumoral e segurança oncológica, morcelação e remoção do espécime.
A agressividade da célula tumoral está diretamente relacionada com o grau e o seu estadiamento podendo exercer impacto direto na recorrência tumoral. A violação dos limites primários do tumor e danos às cápsulas protetoras dos linfonodos comprometidos pode promover a disseminação de células tumorais. Hipoteticamente, poder-se-ia especular que as metástases em sítios de portais poderiam ser conseqüentes às migrações hematogênicas e linfáticas das células tumorais biologicamente ativas.
As metástases em sítios de portais não são relacionadas com a migração hematogênica e linfática das células tumorais, e sim, possivelmente relacionadas com a expressão de disseminação do processo neoplásico como parte do comprometimento e atividade biológica das células ou implantes incidentais relacionados com os procedimentos.
Autores relacionam os implantes em sítios de portais como eventos raros e dependentes da atividade agressiva da biologia celular. As células tumorais têm alto potencial de implante e proliferação ao nível de incisões da pele e anastomoses com possibilidade de aderências às margens e ligações com fibrina.
Estudos realizados consideram que o implante, o crescimento e o desenvolvimento celular podem ser facilitados e acelerados em áreas de traumas e incisões cirúrgicas, principalmente pelo benefício da liberação de fatores de crescimento nesses sítios. Autores publicaram que a manipulação cirúrgica pode promover maior disseminação de células tumorais em níveis superiores ao estabelecimento do pneumoperitônio com CO2.
A exata incidência da recorrência tumoral em sítios de portais ainda não é plenamente conhecida. Estudos do perfil imunológico documentam que o trauma podem deprimir as respostas das funções imunológicas do organismo, permitindo assim teoricamente a progressão de tumores, sua migração e implantes. Trabalhos evidenciaram que as cirurgias laparoscópicas podem preservar as respostas imunológicas em níveis superiores às cirurgias convencionais. As conclusões na literatura atual de que as evidências das manipulações prolongadas do ato cirúrgico aberto e das videocirurgias complexas e prolongadas com múltiplas manipulações coexistem enfaticamente com a etiologia e frequência multifatorial, contribuindo e interferindo no status das respostas imunológicas.
Outro fato consistente é o refinamento técnico das equipes cirúrgicas na realização dos procedimentos minimamente invasivos em oncologia. Os fatores primários e essenciais à perfeita realização dos procedimentos videolaparoscópicos como o tipo de gás, insuflação e desinsuflação, pressão do pneumoperitônio e fatores adicionais incluindo a manipulação e exploração cirúrgica, dissecção cirúrgica com chances de contaminação do instrumental, morcelação e remoção de espécime são importantes na determinação de possibilidades de implantes de células tumorais.
Autores analisaram e concluíram que a insuflação de CO2 tem grande e significante impacto na etiologia e disseminação de células tumorais. Em outros estudos o pneumoperitônio não foi considerado essencial para o desenvolvimento de implantes tumorais em sítios de portais.
Vários tipos diferentes de gases foram utilizados na confecção do pneumoperitônio como CO2, Hélio, ar ambiental e apresentaram conclusões adversas e controversas na literatura.
O pH é um importante e conhecido fator que pode interagir e interferir com os mecanismos locais de defesas do organismo explicando a incidência maior de metástases em sítios de trocater quando utilizado o CO2 na realização do pneumoperitônio comparado com outros gases. Estudos sugerem que os níveis de CO2 podem estimular o crescimento de células tumorais, porém não aumentam o potencial invasivo das mesmas. Estudos comparativos utilizando pneumoperitônio com CO2 e ar ambiente para análise das taxas de crescimento e evolução de células tumorais não evidenciaram diferenças, porém o crescimento das células tumorais foi significativamente maior no grupo onde foi realizado o procedimento laparoscópico. O efeito da insuflação e desinsuflação durante a mobilização de células neoplásicas na realização de processos laparoscópicos têm sido extensivamente estudados. O nível de CO2 podem induzir a disseminação de células tumorais secundário no processo de insuflação que pode condicionar a aerolização das células biologicamente ativas e as mesmas permanecerem suspensas nos gases ou aderidas a pequenas partículas insolúveis. O número de células tumorais encontradas em suspensão não é suficiente para definir e determinar o implante das mesmas. Estudos concluíram que células tumorais estão suspensas em aerosol e os mecanismos de desinsuflações rápidas podem conduzi-las em suspensões líquidas, gotículas e pequenas partículas, sugerindo um possível mecanismo na etiologia do implante tumoral em sítios de portais.
Algumas questões são analisadas como a presença do trauma na introdução do trocater e a persistência de vazamentos de fluxo CO2 em trocateres com defeitos de membranas, criando o efeito chaminé e propiciando o acúmulo de células tumorais em suspensão nos sítios dos mesmos, com posterior implante e desenvolvimento das células tumorais.
Devemos considerar a segurança das cirurgias oncológicas por videolaparoscopia, as margens cirúrgicas de proteção oncológica, o grau e estadiamento tumoral e a agressividade das células neoplásicas, as técnicas e os cuidados com a morcelação do espécime, a utilização de protetores de remoção das peças cirúrgicas e o estado imunológico dos pacientes, na análise, diferenciação e conclusão das possibilidades de implantes tumorais em sítios de portais. 

PREVENÇÃO DA RECORRÊNCIA E IMPLANTES TUMORAIS NOS LOCAIS DE PORTAIS
    Várias medidas preventivas poderão ser utilizadas para inibir e ou diminuir a incidência de implantes de células tumorais em sítios de portais. A irrigação local com agentes citotóxicos utilizando o 5-Fluororacil é uma delas. A instilação com solução de hialuronatos reduz a habilidade de aderência das células tumorais em modelos animais. A utilização de solução diluída de heparina inibe “in vivo” o implante e o crescimento intraperitoneal de células tumorais. A solução de povidine-iodine pode prevenir o implante e a recorrência local tumoral. Estudos mostraram eficácia anti-tumoral com decréscimo da atividade biológica das células utilizando irrigação tópica com agentes alquilantes e citotóxicos como a cyclophosfamida e o methotrexate.
    As cirurgias realizadas com trocateres sem defeitos, colocação dos portais com traumas mínimos e segurança, evitando vazamentos, sua correta fixação evitando deslocamentos podem interferir na segurança do procedimento e minimizar complicações.
    O morcelamento das peças cirúrgicas, quando necessário deve obedecer a todos os princípios técnicos adequados de segurança. Estudos evidenciaram uma incidência maior de implantes em casos de patologias malignas quando os órgãos foram morcelados ou a utilização de protetores para a remoção não foram adequados e seguros. Recomenda-se a utilização de protetores resistentes, impermeáveis e adequados para a remoção das peças cirúrgicas. A drenagem quando necessária deverá ser estabelecida antes de desinsuflação. Em nosso meio, a utilização do povidine nos locais dos portais representa, segundo a literatura atual, medida importante, segura e economicamente viável. Trabalhar com segurança e atenção aos princípios básicos oncológicos, obedecendo aos planos de clivagem, margens cirúrgicas de segurança, não violar espécimes cirúrgicos, utilizar sempre o mínimo manuseio dos tumores e suas adjacências, realizar de rotina a sutura dos sítios de portais com 10-12 mm.

    REFERÊNCIAS
      FONSECA, Gilvan Neiva; NEIVA, Guilherme Camarcio. Metástases Tumorais em Sítios de Portais.
      http://www.fo.usp.br/lido/patoartegeral/patoarteneo6.htm.

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